Pedro Lucas e Caio estão à
frente do equipamento com peças de Gonzagão ( Fotos: André Costa )
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Crato. O Museu do Gonzagão, em Exu (Pernambuco), mantém viva a história do Rei
do Baião. Construído pelo próprio músico, em 1987, foi inaugurado dois anos
mais tarde e, atualmente, atrai milhares de visitantes todos os anos. É lá que
Gonzagão está enterrado, em um mausoléu construído como uma homenagem de seu
filho, Gonzaguinha. Além deste, outros três espaços são dedicados à memória do
músico, um em Caruaru, Interior do Estado, e outros dois em Recife.
Foices, enxadas, radiola,
televisão, rádio e peças de serviços domésticos como louças e fotografias
compõem o acervo criado pelos meninos
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Os quatro locais já possuem bastante notoriedade, mas é há quase 70Km de
Exu, na cidade do Crato, que começa a surgir um quinto espaço dedicado ao Rei
do Baião, bem mais acanhado, é verdade, porém, para os organizadores mirins,
tão importante quanto os demais. É na sala de entrada da casa de taipa que o
pequeno Pedro Lucas, de apenas 10 anos, dispõe, organizadamente, peças
referentes a Luiz Gonzaga, doadas por vizinhos e amigos.
Orientações
A rua sem asfalto ou saneamento básico, no distrito de Dom Quintino,
ganha status e torna-se ponto turístico da comunidade. O espaço possibilita aos
fãs e admiradores do músico pernambucano, que não podem ir ao Estado vizinho,
conhecerem de perto sua história.
Alguns metros antes da casa, uma singela placa de madeira divulga o
equipamento. A frase, escrita pelo próprio punho do pequeno
"museólogo", orienta aos visitantes a seguirem 78 metros adiante. Na
frente da casa, outro letreiro, igualmente simples, fixado em uma placa de
metal, anuncia: "Museu do Luiz Gonzaga".
Logo na entrada, uma cartolina reúne uma minibiografia de Gonzagão. No
primeiro cômodo da pequena casa estão os objetivos que, apesar de não terem
pertencido a Luiz Gonzaga, remetem à sua história. Foices, enxadas, radiola,
televisão, rádio e peças de serviços domésticos como louças, ferro a carvão,
abajur e outros compõe o cenário.
O melhor, no entanto, está por vir. Na mesa principal da sala, ladeada
por duas chinelas de couro, uma sanfona de brinquedo repousa sobre um pano
estampado com a imagem do Rei do Baião. É inevitável apreciar o ambiente e
lembrar da música "Numa Sala de Reboco", composta por Luiz Gonzaga e
Zé Marcolino.
O projeto começou a ganhar corpo há dois anos, quando Pedro visitou o
acervo do Gonzagão, em Exu, com seu avô, chamado de "papai" pelo
adolescente. Encantado com o local, o estudante, que se considera fã do músico
desde os cincos anos de idade, decidiu construir uma "filial" em seu
distrito, distante 26 quilômetros da sede do Crato. O que parecia ser apenas
uma brincadeira de criança, tornou-se realidade com o apoio dos familiares,
sobretudo, de seu avô, o agricultor Antônio Feitosa, 55, e de sua mulher, que
criam o jovem como filho. Além de incentivar o neto, Antônio ajuda na
ornamentação e na preservação do acervo.
O primo, de 7 anos, completa o que eles chamam de "direção".
Pedro se diz proprietário, enquanto Caio é o administrador - e melhor amigo,
conforme ressalta. O ar de seriedade é mantido na fala de Pedro Lucas, ao dizer
que "tudo é feito com carinho e responsabilidade", demonstrando levar
bastante a sério a iniciativa.
A avó de Pedro, Maria Salete de Souza, 50, no entanto, diz ter ficado
"surpresa e espantada" quando o garotinho compartilhou o desejo de
realizar o sonhado projeto na casa de sua bisavó, construída na década de 40.
Orgulho
Passado o "susto inicial", Salete conta que apoiou a causa e
hoje torce para que o projeto cresça cada vez mais. "É motivo de orgulho
para todos nós. O Museu dele já está recebendo a visita de várias pessoas,
inclusive a secretária de Cultura do Crato veio nesses dias", pontua.
A maior parte da coleção dos objetos reunidos é proveniente de doações
feitas por mestres da Academia dos Cordelistas do Crato, amigos e vizinhos da
família. Atualmente, conta-se com 86 peças.
Assim como em qualquer museu, Pedro Lucas estabeleceu os dias em que o
local ficaria aberto ao público. Ele conta que definiu, junto com Caio e o avô,
dias e horários de visita, para que sobrasse tempo "para organizar, limpar
e cuidar do espaço".
Rigor
As doações também possuem rigoroso controle. Tudo é arquivado com o nome
do doador em um livro que o jovem chama de "Documento do Museu".
Escrito em caligrafia própria, o registro contém, ainda, a data em que o objeto
foi doado e a história sobre determinada peça.
A falta de apoio financeiro não inviabilizou o sonho de Pedro em criar
um espaço dedicado ao Rei do Baião, e à "cultura nordestina",
conforme faz questão de acrescentar. O sonho, no entanto, vai além. O jovem diz
que, quando crescer, quer cursar Museologia e aprender a tocar sanfona,
instrumento que é a marca do Rei do Baião.
Embora simples, o ambiente criado pelos jovens não deixa de causar
admiração para os visitantes. Na iniciativa, logo se percebe uma sensibilidade
diferenciada para a história e a reverência à arte por meio da música regional.
Com isso, os meninos ficam no aguardo de que o projeto possa vir a receber
apoio financeiro futuramente.
"Acho bacana poder juntar várias coisas antigas para que as pessoas
de hoje saibam como era no passado", diz. Questionado se trocaria os
tempos atuais pela época em que Gonzagão era vivo, o pequeno não titubeia.
"Claro! Trocaria e ainda iria tentar aprender a tocar sanfona com
ele", finaliza.
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